Christine Lagarde revelou “preocupação unânime” com a escalada da inflação e juros da dívida dispararam

A presidente do Banco Central Europeu revelou esta quinta-feira que os banqueiros centrais da zona euro ficaram “surpreendidos” e “preocupados” com o disparo da inflação.

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A subida da inflação na zona euro em janeiro para 5,1%, um máximo desde a fundação do Banco Central Europeu (BCE) em 1998, apanhou de “surpresa” os banqueiros centrais do euro, que manifestaram “uma preocupação unânime” com esta escalada, revelou esta quinta-feira Christine Lagarde, na conferência de imprensa que se seguiu à reunião de política monetária.

A “preocupação unânime” traduziu-se na intervenção que a presidente do BCE fez na abertura da conferência de imprensa em que se salienta “que a inflação subiu bruscamente nos meses recentes e surpreendeu ainda mais para cima em janeiro”. As palavras-chave “surpresa” e “para cima” imediatamente enervaram o mercado. Lagarde acrescentou que “era uma novidade” nas declarações oficiais do BCE esta “explicitação de que a inflação poderá ser ainda muito mais alta no curto prazo” e que os riscos para a inflação são claramente ascendentes.

Juros alemães dispararam

O mercado da dívida reagiu. Os juros da dívida alemã a 10 anos, que servem de referência na zona euro, quadruplicaram em apenas hora e meia. Abriram esta quinta-feira em 0,036%, pouco acima de zero, e dispararam para 0,13% aquando do fim da conferência de imprensa de Lagarde. Agora já estão em quase 0,15%. A subida contagiou o resto da dívida da zona euro, mas o disparo não foi tão acentuado. Nas obrigações portuguesas a 10 anos, as taxas de mercado subiram de 0,7% para 0,85%, acelerando uma trajetória ascendente que começou em final de dezembro.

Apesar da “surpresa” com a escalada de preços em janeiro – que na Bélgica atingiu 8,5% e nos Países Baixos 7,6% -, o BCE não mudou a sua estratégia “passo a passo” definida em dezembro e reafirmou que o ciclo de subida das taxas diretoras não está para proximamente, ao contrário do que já fez o Banco de Inglaterra (em dezembro e esta quinta-feira, subindo a taxa para 0,5%) e do que já admitiu a Reserva Federal norte-americana, que poderá iniciar o ciclo de subidas na próxima reunião em março.

Contudo, a presidente do BCE sublinhou que a discussão mais aprofundada do surto inflacionista será feita na reunião de março, onde já se contará com as projeções macroeconómicas dos economistas do banco e com a apreciação atualizada pelo conselho de governadores da situação. Todas as decisões estão sempre “dependentes dos dados”, repetiu várias vezes a francesa. A reunião de março poderá ser decisiva quanto a muitas dúvidas que se mantêm: vai o BCE rever em alta a previsão de inflação para 2022 (3,2%) e as projeções para 2023 e 2024 (que apontam para uma queda da inflação para 1,8%, abaixo do objetivo de 2%) que muitos economistas consideram subavaliadas; irá o BCE acelerar o passo na sequência do aperto monetário, colocando o horizonte de subida das taxas diretoras mais próximo do que em 2023 como está implícita na estratégia definida em dezembro passado.

BCE não será “apressado”

Face a insistentes perguntas dos jornalistas de que os mercados antecipavam que o BCE começaria a subir, ainda este ano, as taxas diretoras, a presidente do BCE repetiu que “ainda não estamos na situação de considerar subir as taxas” e que, em quaisquer circunstâncias, essa subida respeitará a “sequência” de aperto na política monetária: primeiro descontinuar o programa especial PEPP, depois diminuir até final do ano as compras mensais pelo programa mais antigo lançado nos tempos de Mario Draghi, e, finalmente, começar a reduzir os reinvestimentos dos valores que forem vencendo na carteira de títulos.

Lagarde garantiu que “não seremos complacentes com a subida da inflação, mas não seremos apressados”. Aos mercados, a presidente do BCE tenta convencer que o aperto da política monetária será sempre “gradual”. Numa resposta, avisou mesmo que “não assumam demasiado no imediato” e pediu “cautela” nas comparações com os Estados Unidos. No entanto, acrescentou que “logo que a situação o exija, nós agiremos e iremos fazê-lo”.

A presidente do BCE reconheceu ainda outra realidade óbvia: “o choque energético massivo”, particularmente violento “na zona euro em que somos muito dependentes de energia”. “Não está no âmbito da política monetária a política dos preços de energia”, disse Lagarde, para mais numa situação em que “50%” do surto inflacionista é devido ao disparo nos preços da energia, uma tendência que vai continuar em 2022. E que até pode agravar-se com as tensões geopolíticas e o risco de guerra na fronteira com a Rússia. Pelo que o aperto na política monetária tem efeitos “limitados” nessa realidade.

Fonte: Expresso